O objetivo do presente texto é mostrar qual o papel preponderante desempenhado pela demonstração racional da existência de Deus na filosofia do Aquinate, concebida como preambulum fidei.
Desenvolvemos a nossa temática do seguinte modo. Primeiro, estabeleceremos a importância do conhecimento de Deus na vida e na obra de Frei Tomás. Em seguida, destacaremos que, dentre as coisas concernentes a Deus, a questão da sua existência ocupa um lugar primordial no discurso tomásico. Prosseguiremos acentuando que esta existência é demonstrável pela razão. Salientaremos o fato de que o Deus do qual Tomás demonstra a existência é ser um transcendente, o mesmo Deus que se revelou a Moisés no Êxodo. Destacaremos, ademais, mediante inferência feita a partir da prova da existência de Deus, a existência de verdades transcendentes, e a possibilidade, também inclusa na demonstração de um Deus transcendente, de este poder revelar verdades transcendentes, as quais, ipso facto, não sendo acessíveis à razão natural, são propostas aos homens para serem cridas. No desenrolar disto, procuraremos apontar para um atributo divino naturalmente cognoscível: a verdade. Tentaremos evidenciar que, sendo Deus a própria verdade, Ele não pode enganar-se e nem enganar-nos e que estes corolários nós podemos admiti-los mediante a razão natural. Posteriormente, voltar-nos-emos para a história, esmerando-nos por tornar patente o fato de que este Deus transcendente, que é a própria verdade, e cuja prova da existência a razão natural pode alcançar, de fato revelou-se aos homens.
Feitas estas considerações, apresentaremos a segunda fase do nosso texto, que se esforçará por atestar a existência, em Tomás, de uma filosofia concebida como preambulum fidei, cujo objetivo precípuo é oferecer razões de credibilidade ao que é proposto pela fé, e à teologia, a base para que ela se justifique enquanto ciência. Estas razões de credibilidade são o que Tomás chama de preambula fidei. Faremos isto mostrando, em primeiro lugar, que a fé, em Tomás, pressupõe a natureza; em segundo lugar, demonstrando como fé e razão não podem entrar em contradição, embora pertençam a ordens distintas e como a razão pode prestar auxílios à fé, mesmo no que toca aos mistérios. Decerto, não os demonstrando, mas provando que a fé não contradiz os princípios naturais e que os argumentos que pelejam contra o que é de fé não passam de críticas aleivosas, fundadas em razões eivadas de erros. Tentaremos, enfim, tornar notório que, inobstante a razão ocupe um lugar importante no ato de fé, mormente quando é conducente à prova da existência de Deus, ela não pode substituir a ação da graça e nem pretende eliminar a fé. Passaremos, então, as considerações finais desta pesquisa, recuperando os seus principais resultados.
Na nossa abordagem, privilegiaremos, entre as obras do autor – em ordem cronológica –, as seguintes: a Summa contra Gentiles (1258 a 1264), na tradução brasileira de Odilão Moura, revista recentemente (1996) pelo Prof. Dr. Luis Alberto De Boni; a Summa Theologiae (1266-1274) – obra-prima do autor – máxime na sua “Prima Pars”, composta entre os anos 1266 a 1272. Transitaremos por ela na nova tradução brasileira que recebeu – empresa de fôlego das Edições Loyola – e que resultou no aparecimento de nove volumes, entre os anos de 2001 a 2006. Também lançaremos mão de La Philosophie au Mon Âge. De Scot Érigène à Guilllaume d’Occam (1922), na versão modificada – La Philosophie au Mon Âge. Dès Origines Patristiques à la Fin du XIV – de 1944. A tradução que seguiremos, no caso, será a brasileira, feita por Eduardo Brandão e lançada pela editora Martins Fontes, em 1995: A Filosofia na Idade Média. Disporemos, ainda, de: Storia della filosofia – Volume II: Patristica e Scolastica, do historiador da filosofia Giovanni Reale, com tradução brasileira por Ivo Storniolo, lançada pela Paulus em 2003. De Garrigou-Lagrange, na sua versão castelhana por Eugenio S. Melo, editada pelas Ediciones Desclée, usaremos, por fim, La Síntesis Tomista. |